A fé acompanha o ser humano durante a vida, é algo que causa no ser humano uma divisão, em determinado momento a fé é um problema a ser resolvido e em outro momento ela mesma é a solução, garantia de que o problema pode ser visto com um olhar novo.
Três elementos são de suma importância para a concretização do ato de fé: o sujeito, o objeto podendo ser uma realidade ou uma pessoa; e por fim, a relação que existe entre o sujeito e o objeto, assim, o elemento da relação é o mais fundamental, pois, é “numa atividade de confiança, entrega,” (LIBÂNIO, 2004, p.10) que a fé vai se realizando.
A Fé é organizada a partir de suas dimensões: a primeira é a fé antropológica, seguida da religiosa, teológica, cristã e eclesial. Não podendo haver alteração entre as mesmas, uma vai construindo a outra.
A FÉ HUMANA é a base para se chegarem às demais dimensões da fé, logo, “crer é a condição de existir num convívio humano” (LIBÂNIO, 2004, p.12). Para existir as relações na sociedade é preciso que a confiança seja colocada em prática, mesmo correndo um risco, pois, “toda fé humana é um risco inevitável” (LIBÂNIO, 2004, p. 15), isto para quem crê e em quem está depositando a confiança, caso um não coresponda de maneira certa gera uma perca de fé no outro.
Neste nível a relação é sempre horizontal, acontecendo em nossa realidade cotidiana, como por exemplo, ao fazermos uma refeição, o que nos garante que a comida foi bem preparada? Certamente, caberá a nós confiar, ter fé. Esta fé pode ter um impedimento, ser abalada pelo medo.
O medo é na realidade um ponto que abala a nossa fé antropológica, é do medo tiramos as maiores dificuldades de acreditar, de confiar. Na medida em que alimentamos o medo, simultaneamente estamos diminuindo a nossa fé, “o medo abala a segurança” (LIBÂNIO, 2004, p.18). O ser humano é alguém a confiar e desconfiar, mais, a fé tem mais força do que a desconfiança, porque “crer é estruturalmente humano” (LIBÂNIO, 2004, p.20).
A FÉ RELIGIOSA é construída sobre a fé antropológica, é predominante o mistério, o transcendente, mas, dois pontos são colocados quando estamos diante de um mistério: o primeiro é nossa limitação para desvendá-lo, e o segundo é o desejo de sempre querer descobrir algo mais sobre o mistério. “mistério seria o ainda não conhecido, mas que um dia conseguiremos conhecer” (LIBÂNIO, 2004, p.21).
Na contemplação da cruz de Cristo como mistério, notamos que o centurião ver no limite de Jesus, a morte que estava clara naquele momento, um esconder-se do filho de Deus que é tão grande (Mc 15,39). “O mistério revela e esconde” (LIBÂNIO, 2004, p.22). Deste modo, o mistério nos causa medo, angustia, pavor, diante daquilo que não é revelado. Por outro lado, é totalmente fascinante, atraente, compreender por pouco que seja algo do mistério.
Olhando para o termo religioso, compreendemos como religar ou relacionar-se, para o ser que tem a fé religiosa, implica uma atenção para com as coisas do divino. “A fé religiosa, em várias de suas expressões, aponta para um mistério pessoal” (LIBÂNIO, 2004, 31). Podemos ver que a relação com a fé religiosa deixa de ser horizontal e passa a ser vertical. “O conhecimento da fé introduz na totalidade do mistério salvífico revelado por Deus” (BENTO XVI, 2012, p.15).
A FÉ TEOLOGAL tem um horizonte mais definido, dirige-se a um Deus que é pessoal e está presente para as seguintes religiões: Judaísmo, Islamismo e o Cristianismo. As mesmas afirmam dois pontos fundamentais: o primeiro é a existência de um Deus pessoal, e o segundo é que esse Deus revela-se para o ser humano, esperando do homem uma resposta positiva com a profissão da fé, confiança.
v A fé Judaica tem como confissão de fé o shemá, presente no êxodo, os mais piedosos ainda “[…] hoje recita o shemá duas vezes ao dia” (LIBÂNIO, 2004, p.33), vale lembrar que para o judeu o nome de Deus é tão sagrado a ponto de não poder ser pronunciado. Os profetas costumam citar o matrimônio como exemplo da aliança entre Deus e o povo. A fé judaica não aceita os livros deuterocanônico, mas “os livros escritos em hebraico, cujo cânone se fixou depois da queda de Jerusalém” (LIBÂNIO, 2004, p. 34). A fé deve ser mais comunitária do que individual. Neste sentido, se tem uma dimensão ética, “fé em Deus implica cuidado da viúva, do órfão, do estrangeiro, símbolos do pobre daquela época” (LIBÂNIO, 2004, p.37). Exemplo de belas orações pode colocar os 150 salmos que os judeus sempre estavam lembrando nas mais diversas circunstâncias da vida.
v A fé islâmica tem como livro sagrado o Corão ou Alcorão, que contém as revelações de Deus (Alá) ao profeta Maomé (570 – 632) ele é o maior profeta “[…] os outros, inclusive Jesus, são inferiores e só valem sendo ratificados por Maomé” (LIBÂNIO, 2004, p.38). A base da fé é formada por cinco pilares: o credo que ratifica a grandeza de Deus (Alá) como também do seu profeta (Maomé). A oração tem início muito cedo na vida e vai até o final de sua vida. Essas orações são sempre acompanhadas “de palavras e gestos bem definidos e fórmulas fixas” (LIBÂNIO, 2004, p.39). A caridade é onde os ricos partilham com os mais pobres por meio de impostos; o jejum de modo especial no período do Ramadã, que é no nono mês do ano lunar; peregrinação a Meca, cada um deve ir pelo menos uma vez “na vida se o fiel tiver recursos para tanto” (LIBÂNIO, 2004, p.40).
A FÉ CRISTÃ vem do próprio Cristo, elemento da revelação, centro de nossa fé cristã esta presente nos dois credos (apostólico e o niceno-constantinopolítano), quando rezamos, estamos professando a nossa fé em Cristo. “A fé cristã é, por conseguinte, teologal, mas compreende Deus como pai de Jesus e como doador do Espírito Santo, sendo, portanto, teologal trinitária” (LIBÂNIO, 2004, p.42). A saudação da missa afirma esta fé trinitária (II Cor 13,13).
Olhando as ações de Jesus, vemos os traços de uma fé verdadeira e transformadora. Em cada mistério Ele revela a união com o pai. Porque não lembrar a parábola do pai misericordioso (Lc 15,11-32), Jesus revela Deus pai como aquele que sempre está nos esperando e quando caímos em si e voltamos, ele vem ao nosso encontro de braços abertos. “E o filho o revela numa profunda experiência de filiação, como seu Pai e de toda a humanidade” (LIBÂNIO, 2004, p. 43).
No mistério da Encarnação, vemos Deus por meio do verbo fazer morado na terra, já que o humano não podia subir a morada de Deus, Ele veio à morada do homem, o cristão que professa a fé em Jesus torna-se necessário testemunhá-lo. Outro mistério é o pascal, fazendo com que a morte não venha a ser o fim, mas uma vida nova, a ressurreição é a verdadeira vida nova ao lado de Cristo Jesus. “Em Cristo, morto e ressuscitado, os traços do futuro absoluto do mundo, carregados de obscuridade e incerteza, adquirem a cor da esperança baseada na revelação da trindade” (FORTE, 1995, p.367).
A FÉ ECLESIAL na vivencia da fé cristã foi se organizando a igreja, ganhando sentido quando explicita na fé eclesial, tendo a palavra, os ritos e a organização, elementos que não podem faltar na fé eclesial.
v A palavra: recomenda o Vaticano II na constituição dogmática Dei Verbum: “É preciso que o acesso à Sagrada Escritura seja amplamente aberto aos fiéis” (nº22);
v Os ritos: é apresentado como fundamental a vivência dos sacramentos. “Os sete sacramentos atingem todas as etapas e todos os momentos importantes da vida do cristão: dão à vida de fé do cristão origem e crescimento, cura e missão” (CIC nº1210). É importante destacar o sacramento da Eucaristia, que ocupa um lugar único na fé da igreja;
v A organização: tem sempre o papa como pontífice, sendo ajudado pelos cardeais, além disso, temos os bispos, padres e diáconos, ordenados para melhor organizar e servir o povo, como em cada comunidade existe pessoas leigas que também contribuem. “O caminho teológico está indicado pelo próprio Jesus e a autoridade na igreja não é poder, mas serviço” (LIBÂNIO, 2004, p.53).
Sendo a fé uma resposta do ser humano ao Deus que tem o desejo de revelar-se. Ele coloca no próprio homem a capacidade de confiar (fé antropológica), só que o homem vai à busca do mistério (fé religiosa), e acolhendo a revelação, conhece Deus pessoal que sempre deseja falar como o homem (fé teologal), dando um passo além das outras religiões acreditamos em Jesus Cristo (fé cristã) e este mesmo Jesus deixou uma comunidade (Mt 16,18) colocando a sua frente Pedro, o primeiro papa para continuar a sua missão, logo, temos a igreja (fé eclesial). Só tem sentido a fé quando é colocada em prática, a fé não é algo abstrato mais sim concreta, gera ações em favor da vida na comunidade (Jo 10,10)
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Hugo França de Sousa (Paróquia N. Sra. de Fátima)
Seminarista da Diocese de Patos-PB
1º Ano de Teologia no Seminário Arquidiocesano
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REFERÊNCIAS
BENTO XVI. Porta fidei: carta apostólica com a qual se proclama o ano da fé. São Paulo: Paulinas, 2012 (A vos do Papa).
CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. São Paulo: Loyola, 2000.
COMPÊNDIO DO VATICANO II: constituição, decretos declarações. Petrópolis: Vozes, 1987.
FORTE, Bruno. Teologia da história: ensaio sobre a revelação, o início e a consumação. Tradução Georges Ignácio Maissiat. São Paulo: Paulus, 1995 (Coleção Teologia Sistemática).
LIBÂNIO, João Batista. Fé. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2004 (Coleção Passo-a-Passo, nº 34).